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Matinas do Natal - Padre José Maria Xavier

Padre José Maria Xavier
Orquestra Ribeiro Bastos

Track NameMatinas do Natal - Padre José Maria Xavier
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Gravação de som realizada nos dias 20 e 21 de outubro de 1979 na Igreja de Nossa Senhora do Carmo, em São João dei Rei, Minas Gerais (2 microfones AKG D190, gravador Revox A77, fita Scotch 206). Montagem da fita no estúdio de Travessia — Oficina de Música, São Paulo, em 27 e 28 de outubro de 1979. Matrizado em Vice-Versa, São Paulo, em 5 de outubro de 1979. Gravação, montagem e supervisão da edição, Conrado Silva. Fotografia e arte final, Jorge Falco. filmes de Polychrom. Edições Tacape, Brasil, 1979.

Capa e Encarte

Textos do Encarte

MATINAS DO NATAL

PADRE JOSÉ MARIA XAVIER

TACAPE — SÉRIE MEMÓRIA MUSICAL — ESTÉREO — T002

 

Padre José Maria Xavier (1819-1887)  MATINAS DO NATAL  


FACE A

1 Invitatório

2 Responsório I

3 Responsório II

4 Responsório III

5 Responsório IV


FACE B

1 Responsório V

2 Responsório VI

3 Responsório VII

4 Responsório VIII


 

ORQUESTRA RIBEIRO BASTOS

Regente: José Maria Neves

 

Este é o segundo disco da Orquestra Ribeiro Bastos. O primeiro, lançado inicialmente pelas Ediciones Tacuabé de Montevideo e, a seguir, prensado no Brasil por Tacape, foi um documento sobre a SEMANA SANTA EM SÃO JOÃO DEL-REI, e incluía algumas das obras mais representativas do repertório de cada cerimônia. Este disco teve, em duas faixas. a colaboração da Orquestra Lira Sanjoanense.


A Orquestra Ribeiro Bastos é uma das raras corporações setecentistas ainda vivas e atuantes. Três vezes por semanas, nas missas da Catedral de Nossa Senhora do Pilar e da Igreja de São Francisco, em diversas novenas e, especialmente, na Festa de Passos e na Semana Santa, esta orquestra dá sua contribuição para o abrilhantamento do culto e para a manutenção do repertório religioso mineiro do passado. 'Longe do profissionalismo do século XVIII, seus músicos dedicam-se às mais diversas profissões, reservando grande parte de suas horas de lazer para os ensaios e atuações, pelo gosto de fazer música, por terem consciência de serem os herdeiros da tradição musical mineira e por sentirem-se responsáveis pela guarda desta tradição.


As Matinas do Natal do Padre José Maria Xavier são executadas a cada ano, em São João del-Rei, pelas duas antigas corporações musicais da cidade. Não se realizando mais o oficio de Matinas, os responsórios são tocados em diferentes momentos das missas durante todo o período natalino advento e Natal.


Como no primeiro disco, não houve aqui nenhuma preocupação de "embelezamento", que poderia transformar a sonoridade e a interpretação habitual do conjunto. Neste sentido, este disco é, antes de tudo, um importante documento musicológico, registrando rigorosamente a maneira como estas Matinas do Natal são executadas agora — dentro da linha interpretativa do passado — em São João del-Rei.

 

Paulo Cunha Menezes                       

 

Capa: Rua Santo Antonio, São João del Rei – Tom Maia 76.

As sedes das Orquestras Ribeiro Bastos e Lira Sanjoanense ficam na Rua Santo Antônio.

 

FUNDACAO ROBERTO MARINHO   



MATINAS DO NATAL

Padre José Maria Xavier

 

O Natal é motivo musical frequente em todas as regiões de tradição cristã, tanto pelo que esta celebração evoca, no plano religioso, quanto pelo caráter mesmo das festas familiares e comunitárias que se fazem nesta ocasião. Nossa tradição popular guarda exemplos de cantos e folguedos que se adaptaram às condições particulares da celebração brasileira do Natal. Nos domínios da criação erudita, o Natal se fez também presente em muitas ocasiões, dando origem a obras literárias, plásticas e musicais de importância.


Muitos compositores brasileiros deixaram obras sobre este tema. A mais antiga delas parece ser a Oratória ao Menino Deus, de Inácio Parreiras Neves, compositor mineiro falecido em 1794. Não se pode esquecer também as obras natalinas do Padre José Maurício Nunes Garcia, como a Missa Pastoril para a Noite de Natal e as Matinas do Natal. As Matinas do Natal do Padre José Maria Xavier são, em São João del-Rei, o exemplo maior de obra natalina, por seu valor musical e por sua popularidade.


O Padre José Maria Xavier viveu e exerceu suas atividades musicais numa época certamente menos favorável que a de seus predecessores imediatos. Passara a época da grande riqueza e do fausto das festas religiosas e profanas e o profissionalismo musical dera lugar a amadorismo magramente subvencionado pelas irmandades, confrarias e ordens terceiras. E, no plano musical, o purismo de caráter clássico dava lugar às influências da ópera italiana, começando a caracterizar-se novo estilo, que alguns estudiosos julgam decadente, mas que, na verdade, representa uma outra maneira de fazer e ouvir música corresponde a outras necessidades e revela outro tipo de informação e de formação.


Quando o Padre José Maria Xavier nasceu, já haviam falecido Inácio Parreiras Neves (1794), Jerônimo de Souza Lobo (1803), José Joaquim Emerico Lobo de Mesquita (1805), Marcos Coelho Neto pai (1806) e Manoel Dias de Oliveira (1813), e quando ele iniciou-se na composição já não existiam Marcos Coelho Neto filho (1823), Padre João de Deus de Castro Lobo (1832), Antonio dos Santos Cunha (última notícia em 1815) e Joaquim de Paula Souza Bonsucesso (ca. 1820). Ele foi contemporâneo de Francisco Martiniano de Paula Miranda, Marcos dos Passos Pereira, Francisco José das Chagas, Presciliano Silva, Firmino Silva e Martiniano Ribeiro Bastos, que, com exceção do Mestre Chagas, sobreviveram a ele.


Filho do alferes João Xavier da Silva Ferrão e Maria José Benedita de Miranda, José Maria Xavier nasceu numa grande casa da Rua Santo Antonio, em São João del-Rei (a poucos metros de onde estão as sedes da Orquestra Ribeiro Bastos e da Lira Sanjoanense) no dia 23 de agosto de 1819. Seu professor de primeiras letras foi Guilherme José da Costa. Seu aprendizado musical foi orientado por seu tio Francisco de Paula Miranda, que dirigia um dos coros de música da cidade, aquela que hoje é a Orquestra Lira Sanjoanense, dedicando-se ao canto, ao violino e à clarineta. Por esta época, seguiu seus estudos com mestres de latim, francês, história, geografia e filosofia. E foi aluno dos mais aplicados, pois em 1840 recebeu medalha de prata em distribuição de prêmios entre os melhores alunos da cidade.


Sentindo vocação para o sacerdócio, José Maria Xavier inicia seus estudos de teologia no Seminário de Mariana, onde é ordenado presbítero 19 de abril de 1846, pelas mãos de Dom Viçoso. Logo a seguir, inicia suas atividades sacerdotais, como vigário de Rio Preto (MG), no período de 21 de fevereiro de 1847 a 29 de maio de 1848. Por motivo de saúde, volta para São João del-Rei, onde assume diversas funções religiosas e dedica-se à música, como instrumentista e compositor. Ele lecionou em diversos estabelecimentos de ensino, foi capelão do Colégio Duval, presidiu por mais de dez anos a Confraria Vicentina de Nossa Senhora do Pilar, prestou serviços à Confraria de São Gonçalo Garcia, foi comissário da Ordem Terceira do Carmo, provedor da Santa Casa da Misericórdia, capelão da Irmandade dos Passos e da Confraria de Nossa Senhora do Rosário e definidor da Ordem Terceira de São Francisco. Em 1854 assumiu, por pouco tempo, a função de vigário da vara de São João del-Rei. O compositor teve também alguma atuação política, militando no Partido Conservador até que, havendo alteração no programa partidário, ele o abandonou. Ele veio a falecer no dia 22 de janeiro de 1887, dias depois de uma queda acontecida quando podava árvore de seu quintal.


Existe uma única pequena fotografia do compositor, mostrando seu rosto severo. O melhor documento sobre ele é, certamente, o elogio fúnebre escrito pelo coronel Severiano de Rezende e pub li uma semana após seu falecimento no Arauto de Minas. Ali, o membro do Partido Conservador é descrito como "aferrado adepto à antiga bandeira de ordem, legalidade e respeito ao princípio autoritário. Não pertencia a nuance dos conservadores que deixam enxertar na doutrina antiga ideias que mais cabem num programa liberal; legitimista convicto, em vez de aceitar as inovações modernas, seu espírito pendia ao absolutismo que, em sua opinião, julgava mais consentâneo com o bem-estar e a tranquilidade dos povos". Mas sua austeridade, que lhe vedava toda sorte de diversão, no dizer de seus contemporâneos, era equilibrada com suficiente abertura de espírito, mostrada na dedicatória que lhe fez José Antonio Rodrigues em um livro: "sacerdote sisudo e circunspecto, que sabe dar desconto aos desvarios da humanidade".


A produção musical do Padre José Maria Xavier é extensa e está bem conservada em arquivos mineiros, sendo executada até hoje em todas as festas importantes. Pode-se dizer que todas as solenidades religiosas importantes tiveram música especialmente composta pelo Padre José Maria Xavier. A título de informação, pode-se citar as Missas (Kyrie e Gloria) e os Credos (Credo, Sanctus e Agnus Dei), muitos Hinos, Antífonas e Salmos, diversos Te Deum alternados, as Novenas de Santa Rita, São Sebastião, Nossa Senhora do Carmo, entre outras, as Matinas de Natal, da Ressurreição, do Espírito Santo, da Assunção, da Conceição, do Coração de Jesus, de São José e de Santa Cecília, além da série de obras para a Semana Santa, como as Endoenças Completas (Matinas e Laudas para quinta, sexta-feira e sábado santo), os Tractus, o Popule Meus e o Adoramus te Christe para sexta-feira santa, os Bradados (para o canto da paixão segundo São Mateus e São João), os Tractus para sábado santo. Seu interesse para a música instrumental pura foi menor, conhecendo-se apenas uma Valsa para Cordas, o Minueto para o Setenário das Dores e os minuetos As Flautas e A Gosto de Pleyel, e a Abertura para o dia 14 de agosto. Em 1872, por ocasião da 5a Exposição Industrial de Juiz de Fora, o compositor foi agraciado com a Medalha de Prata pela sua obra musical.


Técnica e esteticamente, o Padre José Maria Xavier é herdeiro da música setecentista mineira, com a qual ele teve contato através de mestres que viveram no fim do século XVIII e início do século XIX. Como eles, o Padre José Maria se apega à escritura coral essencialmente harmônica, apoiada pela orquestra, e sobre a qual pairam sempre linhas melódicas — às vezes passando de instrumento a instrumento — que asseguram a unidade estrutural da obra. Mais que nos compositores cariocas seus contemporâneos, suas melodias não são retomadas da melódica da ópera italiana, mas até se aproximam do corte geral da cantiga popular. Os esquemas harmônicos são simples, construídos dentro das normas do tonalismo, mesmo quando aparecem modulações ou encadeamentos menos convencionais. O emprego da orquestra revela bom conhecimento da técnica, opondo fragmentos de cunho camerístico a estruturas mais sinfônicas, realizando variações de dinâmica por aumento ou diminuição da massa coral e orquestral. Sua orquestra é maior que a do passado mineiro, constituindo-se geralmente de flautas, clarinetas, trompete, trompas, ofcleide e cordas, podendo aparecer ainda o trombone. No que se refere à forma, excetuando-se as obras curtas e livres, ele respeita a tradição, construindo as grandes peças segundo o corte formal consagrado. Assim, os Responsórios dos ofícios terão o número tradicional de movimentos. Em missas curtas, entretanto, algumas vezes ele faz condensações que o levam a não empregar a divisão habitual de movimentos.


O Ofício Divino é a oração oficial da igreja católica, sendo formado de oito momentos distribuídos pelo dia: Matinas (meio da noite), Laudes (nascer do dia), Prima, Terça, Sexta e Nona (de acordo com a antiga divisão horária do dia, correspondente a 6, 9, 12 e 15 hs.), Vésperas (por-do-sol), e Completas (última oração da noite). Cada um destes momentos de oração tem estrutura particular, compreendendo o canto de alguns salmos, antífonas, hinos, responsórios, trechos bíblicos para meditação, etc. Para os dias feriais (sem festividade especial), há esquemas básicos que se repetem durante todo o ano, e para cada solenidade do calendário litúrgico existem ofícios especiais. Tradicionalmente, todas as partes do ofício eram cantadas em comunidade, havendo maior solenidade nas Matinas, Laudas, Vésperas e Completas. Alguns compositores europeus usaram texto do Ofício Divino para suas obras, com forte preferência pelas Vésperas. No Brasil, para as grandes festas, deu-se mais destaque para as Matinas, que muitos compositores musicaram.


Nas Matinas brasileiras, o esquema formal usado é sempre o mesmo, alternando o canto gregoriano dos padres com a "música" (coro e orquestra). O ofício de Matinas começa pelo Invitatório, seguindo-se três partes (Noturnos), cada um dos quais composto do canto de três salmos com suas respectivas antífonas, seguidos de três lições (trechos bíblicos e ensinamentos do magistério eclesiástico), cada uma delas seguida de seu Responsório. Cabia ao coro e orquestra o Invitatório e os Responsórios, ficando todo o resto a cargo dos religiosos, em gregoriano. Nas grandes festas, o último Responsório dá lugar ao Te Deum Laudamus. Por isto, nas Matinas do Natal há sempre oito responsórios.


Os Responsórios, por sua vez, obedecem sempre a estrutura formal predeterminada, uma vez que a composição literária (com repetição de frases) é sempre igual. O esquema básico do texto, por frases, é A—B—C—B, com a variante (último responsório de cada Noturno) A-B-C-B-D-A-B, O primeiro momento (A) é sempre em andamento moderado e meditativo como caráter geral, enquanto o segundo (B) é sempre movimentado e mais brilhante; o terceiro movimento, o Verso (C), é novamente lento e suave e sempre escrito para voz ou vozes solistas e poucos instrumentos, contrastando com o B, que é logo repetido. Quando há o Glória Patri (D), ele é lento e com sonoridade leve, sendo retomados, a seguir, o andante e o allegro iniciais. Para esta gravação, optou-se por tocar o Gloria Patri imediatamente depois do verso e antes da repetição do segundo movimento.


A determinação dos andamentos, sempre presidente nas obras do Padre José Maria Xavier, levanta problema de interpretação que pode, talvez, ser alargado para toda a música mineira do passado. De fato, na tradição de interpretação guardada pelas antigas corporações musicais mineiras, todos os andamentos são mais lentos que os marcados pelo metrônomo. Duas respostas se apresentam: ou os andamentos eram realmente mais lentos, ou deu-se o hábito de fazê-los mais lentos em razão das limitações técnicas dos amadores locais, que não conseguiam, no allegro, o movimento pedido. Há, entretanto, interessante observação autografa do Padre José Maria Xavier, na primeira folha do Ofício de Ramos, de 1871: "Modifique-se e modere-se os andamentos, principalmente os allegros, a fim de guardar o decoro da Música Sacra. Os graus altos do Metrônomo são da Ópera Lírica e mais músicas profanas".


A data de composição destas Matinas do Natal, provavelmente 1856, não pôde ainda ser confirmada por documento do autor. Ao contrário da quase totalidade dos compositores setecentistas e da maioria dos oitocentistas mineiros, o Padre José Maria Xavier deixou partitura da maioria de suas obras, e não apenas as partes separadas de vozes e instrumentos. Estas partituras estão sempre datadas e assinaladas. A partitura autógrafa destas Matinas, entretanto, foi enviada à Alemanha, onde apareceu edição completa em excelente trabalho gráfico, na qual há a seguinte indicação na capa e folha de rosto: "Música Sacra — Matinas do Natal de Nosso Senhor Jesus Christo à 4 vozes e Pequena Orchestra do Padre José Maria Xavier. Natural de São João del-Rei, no Brasil e província de Minas — Em Junho de 1885 — München". A partitura tem 55 páginas em formato 33,3x26 cm, sem nenhuma indicação de casa editora.

 

JOSÉ MARIA NEVES



          

Pró-Reitoria de Extensão e Cultura | UFSJ

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